O Bolsa Família tem pouco impacto na saúde das crianças das famílias atendidas pelo programa, indica um estudo do Centro Internacional de Pobreza, instituição de pesquisa do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Fonte: Carolina Glycerio, de São Paulo
Segundo os autores do estudo, o programa eleva a demanda por serviços de educação e saúde porque exige que os pais mantenham os filhos na escola, cumpram o calendário de vacinação infantil e, no caso de mulheres grávidas, façam exames pré-natal.
Por outro lado, essas necessidades nem sempre são atendidas porque, supõem os pesquisadores, nem todas as famílias têm acesso a uma boa estrutura de educação e saúde.
“As nossas conclusões apontam que pelo lado da demanda, pode estar dando certo, mas o que pode não estar dando certo é a escassez de oferta e a falta da qualidade de serviço”, afirma um dos autores, o economista Rafael Perez Ribas.
Por exemplo, uma porcentagem entre 70% e 80% das crianças de famílias inscritas no programa têm carteira de vacinação e, entre elas, nem todas estão com as vacinas em dia.
“Os dados nos levam a presumir que a cobertura de saúde para as famílias beneficiárias não é tão universal quanto se pensava.”
Ribas e outros dois pesquisadores do Centro Internacional de Pobreza, parceria do Pnud com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), analisaram dados de 2005 da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (Sage) do Ministério do Desenvolvimento Social.
As comparações foram sempre feitas com famílias em situação de pobreza semelhante, mas excluídas do programa.
Desempenho na escola
Os números mostraram também que, embora o programa aumente a freqüência escolar, por exigir que as crianças das famílias beneficiárias freqüentem a escola, elas repetem mais de ano do que aquelas que estão fora do Bolsa Família.
Para Ribas, isso mostra que o grupo de crianças que antes deixava de estudar, por causa de dificuldades de aprendizado, agora está na escola, o que é positivo. Entretanto também expõe a falta de qualidade do ensino.
“Programas como o Bolsa Família não vêm para resolver o problema da qualidade da educação”, afirma o economista.
“O programa dá incentivo para a criança permanecer na escola e nisso cumpre a sua função. Mas é a qualidade do ensino que vai determinar a sua aprovação.”
“Falta uma integração de políticas entre os ministérios.”
Os dados também indicam que o programa tem sido ineficaz no combate à desnutrição infantil na faixa dos 12 aos 35 meses de vida, a fase mais crítica do desenvolvimento da criança, em que o problema pode provocar conseqüências irreversíveis.
“Nessa faixa, a diferença entre beneficiários e não beneficiários não existe”, ressalta o pesquisador. “As orientações que deveriam ser dadas aos pais, de acompanhamento do peso, por exemplo, podem não estar sendo dadas.”
Para crianças até 12 meses, o efeito é positivo, ou seja, aquelas que são beneficiadas pelo programa estão menos sujeitas ao problema do que as que estão fora.
Ribas atribui o fenômeno a uma boa instrução das mães no período pré-natal e pós-parto, cuidado que, supõe, esteja sendo abandonado depois dos 12 meses da criança.
Os economistas Fábio Veras Soares e Rafael Guerreiro Osório foram co-autores de Rafael Ribas no estudo, intitulado Avaliando o Impacto do Programa Bolsa Família: uma comparação com programas de transferência condicionada de renda de outros países.
O Bolsa Família é comparado com os programas de transferência de renda do Chile (Chile Solidário) e do México (Oportunidades). Eles concluem, por exemplo, que o programa brasileiro é o menos eficaz dos três quando se analisa o impacto sobre os 10% mais pobres. “Destinam, respectivamente, 36% e 37% do total das transferências para esse grupo, contra 33% do Bolsa Família”, diz o estudo.
Segundo o trabalho, porém, o programa brasileiro tem o melhor desempenho quando é considerado o volume total de transferências.
Apesar das ressalvas, os pesquisadores concluem que o Bolsa Família está cumprindo os seus objetivos de transferir renda e diminuir a proporção de pobres no país e destacam que os três programas de transferência de renda tiveram “excelente desempenho” na seleção dos beneficiários.
Eles também contestam críticas de que o Bolsa Família desestimula os beneficiários a trabalhar. Segundo o estudo, os adultos que eram atendidos pelo programa em 2005 tinham uma participação vezes 2,6 maior na força de trabalho em relação aos que estavam fora do programa.